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quarta-feira, 11 de maio de 2016

Expo: ComCiência

Distanciamento da Animalidade
Por Rodrigo Roddick

A exposição ComCiência, de Patrícia Piccinini, é pautada por esculturas hiper-realistas que remete ao espectador o reconhecimento de seu eu natural. As obras são como um reflexo da animalidade que nos constitui, afinal somos animais e sempre nos esquecemos disso. Ao caminhar por elas, no entanto, lembramos que não somos maiores ou menores que quaisquer espécies, somos apenas vidas animais. As ilustrações podem causar uma repulsa, à primeira vista, mas logo causa uma aproximação do espectador com a obra.

O Visitante, de Patrícia Piccinini


Paralelamente a essa interpretação, há uma discussão entre o uso indiscriminado da ciência e na tendência que o homem tem de humanizar tudo o que vê. A exposição levanta questões sobre a possibilidade do uso da ciência genética para criar máquinas com vida, que seriam nossos substitutos para realizar tarefas que são muito mundanas. Imagine se pudéssemos criar seres que poderiam dar carinho aos nossos filhos, brincar com eles, coloca-los para dormir, amamentá-los, enquanto estamos ocupados com outras coisas importantes.

Os amantes, de Patrícia Piccinini
Logo de início, o espectador se depara com uma obra constituída por um conjunto de motos, indicando como a sociedade substituiu a vida animal pela morte do metal frio, destruindo o ambiente natural em uma área urbana para atender a essas novas construções humanas. Obviamente uma crítica a interferência destrutiva do homem, como também o dilema de se pegar um recurso natural e decidir se seu uso será para alimentar nossa existência natural ou alimentar máquinas, como os biocombustíveis, por exemplo. Aponta que isso seria dar vida a maquina e que o ser humano tem a insistência em seguir nesse caminho.

Indiviso

A maioria das obras, porém, se baseia na representação do ser humano natural, embora algumas sejam produtos da imaginação criativa de uma criança. Pode-se observar a constante aparição de características primatas, representadas pelos macacos, mas alguns seres que não existem em nosso mundo. A escolha desse animal não foi aleatória, afinal é o que possui as características mais próximas do ser humano. A ideia é fazer o espectador se identificar com as obras, imaginando que poderiam estar em seu lugar, realizando as tarefas mundanas como as criaturas estão fazendo, como brincar com as crianças, fazê-la dormir, dar carinho, etc. Existe uma linha de pensamento que apresenta a opinião de que não devemos nos distanciar dessas ações, que a vida se encontra nesses pequenos gestos.

A Confortadora
Pavão de O Visitante


 “Caminhando pela sala em que estas esculturas estavam, percebi a presença de ‘a confortadora’ como se ela fosse real, pois quando passei pro ela rapidamente, achei que fosse uma pessoa de verdade sentada no chão. Os detalhes muito bem feitos, realísticos, que Patrícia Piccinini empregou em suas obras, por vezes nos confunde se existe vida nas obras ou não. Foi o que eu senti quando o vi o pavão. Achei que a qualquer momento ele fosse se mexer. Tive a mesma sensação com outras obras. Em alguns momentos, me peguei pensando, ‘agora ela vai sorrir’ ou ‘ele vai se levantar’, etc. É realmente impressionante como as obras conseguem possuir mais vida do que quem a observa.” - Rodrigo Roddick

Grande Mãe
A obra que mais chamou atenção foi a “grande mãe” pela simplicidade da imagem, uma criatura animal amamentando um bebê humano. Embora a escultura trate de uma representação de uma mulher ausente da tarefa de amamentar para dar atenção a sua vida cotidiana, o que mais se destaca nela é o olhar triste que exibe ao encarar o espectador. Quando se encara seu olhar, a pessoa se sente como se sua tristeza fosse por causa de quem a aprecia. É por esse caminho que se compreende esta obra e se observa sua beleza. Ela estava triste porque a pessoa que a apreciava, que é viva, tinha trazido o bebê para esse mundo, se ocupou mais de suas tarefas superficiais do que cuidar dessa vida que pôs no mundo. Existe uma bolsa feminina nessa obra, que revela justamente as tarefas cotidianas que o ser humano cotidianamente tem. Em uma concepção mais ampla, a grande mãe está triste porque percebe que ela, apenas uma escultura fria, tem mais vida que o ser vivo que a observa. É a obra mais bela da exposição.


O olhar triste de Grande Mãe
A ciência é a principal vertente utilizada para as discussões das obras, e ela é algo estritamente humano. A análise, por meio das ilustrações expostas, apresenta o pensamento desconfortável que o homem realmente está tentando humanizar tudo ao seu redor, usando a ciência, algo humano. Seria então a ciência um grande desrespeito a natureza? Ou seria o uso indiscriminado dela, novamente pelo homem, que torna essa ideia aparente?

A mostra teve início no dia 27/04 e vai até 27/06/2016, das 9h às 21h. Ela ocorre no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) e tem entrada franca.

Para mais informações sobre a exposição, clique aqui.


No site oficial de Patrícia Piccinini, você encontra estas e outras obras produzidas pela artista.

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